Entenda o que é, para que serve esse tipo de pesquisa científica e como funciona na prática
É comum as empresas fazerem pesquisas de mercado e um dos métodos utilizados é o estudo observacional. Trata-se de um tipo de pesquisa que observa as pessoas e entrega um conjunto de informações sobre um produto ou serviço de uma maneira distinta das pesquisas declarativas – que se baseiam em perguntas e o entrevistado escolhe uma alternativa ou responde com suas palavras.
A vantagem do estudo de observação é que ele não passa pelo discurso das pessoas. Roberta Campos, professora do Mestrado Profissional em Comportamento do Consumidor da ESPM, explica que quando um pesquisador faz uma pergunta para uma pessoa há uma tendência natural de a resposta descritiva não ser necessariamente fiel à realidade.
“Há uma série de hábitos, e muitos são cotidianos e inconscientes, que as pessoas automatizaram e têm dificuldade de descrever de forma fiel”, explica. “Se você pedir para sua avó uma receita que ela faz a décadas, ela vai ter muita dificuldade de te passar a receita porque aquilo já é incorporado. Então ela vai te dizer um tantinho daquilo, um tantinho daquilo outro, porque na verdade ela simplesmente performa e não sabe dizer como faz”.
A observação traz respostas mais consistentes
Dependendo da análise que se pretende fazer é melhor observar diretamente o consumidor, porque assim é possível ver o seu comportamento e receber uma resposta mais acurada.
Roberta cita um projeto que desenvolveu para o segmento de beleza. As pessoas contavam como era a sua rotina de cuidados com a pele e a pesquisadora pedia para mostrarem onde estava o produto a que se referiam. Era comum os produtos que as pessoas diziam usar todos os dias estarem no fundo de uma gaveta vencidos.
Essa observação in loco é uma oportunidade muito preciosa em pesquisa, que é lidar com as contradições. A pessoa diz que usa um creme todos os dias, mas na verdade isso não acontece e a pesquisa ganha uma evidência real, uma outra camada de entendimento dos hábitos do consumidor.
Estudo observacional na prática
Existem estudos observacionais tradicionais como o Comprador Misterioso, muito usado na área de prestação de serviços. Uma empresa de telefonia que possui uma rede franquias pode analisar como as lojas vendem um plano novo com esse método.
Cria-se um roteiro de avaliação do atendimento e os entrevistadores visitam as lojas agindo como se fossem clientes. Simulam uma experiência de compra e observam aspectos como atendimento aos clientes, organização da loja e coordenação de filas, entre outros fatores.
O estudo observacional também é muito comum na área de pesquisa e desenvolvimento e tem grande valia quando uma empresa vai, por exemplo, lançar uma batedeira e quer entender como o consumidor usa o eletrodoméstico. Nesse caso é necessário promover um ambiente de interação física com os produtos e os clientes.
“Teve um estudo que me chamaram para fazer, em que a empresa queria ver o uso de um ingrediente culinário. Acompanhei uma família que tinha como briefing preparar um almoço. Eu fiquei observando a preparação e perguntava ‘o que você tá fazendo agora? você fez o quê? você buscou o quê?’”. Conversar com quem está sendo pesquisado é comum, porque existem coisas que se observa silenciosamente, e basta ver e anotar, mas em outros casos a interação dá uma resposta mais ampla e completa.
Roberta explica que no mercado de cosméticos de luxo as pesquisas estudam, por exemplo, que parte da mão uma consumidora usa para aplicar um creme facial. Se usa a ponta dos dedos a sensibilidade é diferente de outra parte do dedos.
Como é o método de estudo observacional
A observação pode ser mais ou menos estruturada e pode ser realizada em um ambiente natural (uma loja, por exemplo) ou em um laboratório ou local fechado. O método do Comprador Misterioso é superestruturado com roteiro, enquanto um estudo que analisa como o adolescente manuseia o celular na escola é aberto. “O que observar e como, o próprio fenômeno vai me conduzir”.
Um elemento muito importante na observação é o Diário de Campo onde o pesquisador anota todas as impressões do que é visto, como ele se sente, o que observa e o que estranha, já que as emoções são mecanismos de metodologia. É permitido tirar foto, filmar, usar recursos como eye tracking, câmeras de segurança, combinar entrevistas e fazer pequenas interações durante a observação.
Existem determinados segmentos, como pesquisa e desenvolvimento e design, que apostam muito no método observacional. Em User Experience, por exemplo, se a empresa vai desenvolver um produto digital há uma série de ferramentas, entre elas o eye tracking, que são de monitoramento em tempo real sobre como uma pessoa está explorando aquele espaço.
Isso apresenta um resultado melhor e mais fiel da realidade do que uma pesquisa com alternativas de resposta. Com base no resultado é possível aprimorar a usabilidade e criar um ambiente digital com mais clareza para o consumidor e ser mais inovador.
Estudo observacional nas empresas
O estudo observacional pode ser ferramenta útil para empreendedores e startups medirem a aderência à sua marca entre os consumidores antes ou logo após o lançamento. Já as empresas consolidadas no mercado, além de pesquisarem seus produtos, podem se valer das avaliações para mapearem como eles são utilizados de maneiras diferentes e talvez surjam possibilidades de inovação, como criar um produto para deixar os azulejos mais brilhantes.
A especialista aponta outra vantagem desse tipo de estudo, que tem um caráter de transformação do gestor. De maneira geral esses profissionais não conhecem a realidade das classes B e C e é importante ter consciência de como essas pessoas vivem e consomem.
“No Brasil, se você não conquista as classes B e C em lançamento de massa, normalmente o produto não se viabiliza financeiramente”, afirma. “A classe C representa quase 50% da população brasileira, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP), e ganha entre dois e cinco mil reais mensais. Uma pessoa de Classe A que está em uma empresa não faz a mínima ideia do que é viver com dois a cinco mil reais por mês”.
O gestor de produtos de massa tem que saber falar com as classes B e C e entender o contexto da vida do consumidor traz um panorama mais real. Isso só é captado quando esse líder compreende que um produto que ele acha superbarato pode ser um luxo para algumas pessoas. Tudo fica em uma perspectiva real e não numa perspectiva idealizada.
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